que, de tolo, até pensei que fosse minha

quarta-feira, 11 de junho de 2008

essa entra pra aquela seleção de "coisas que eu gostaria de ter escrito".

"Dizer que eu não possuía absolutamente nenhum potencial para me tornar escritor não seria verdade,estritamente falando. Eu estava sempre inventando coisas e contando histórias. Nunca cheguei realmente a ESCREVER alguma coisa, mas ainda assim o potencial existia.
Invariavelmente, minhas histórias eram simples versões exageradas da verdade. O mais típico era começar com alguma experiência estranha que valesse a pena contar de novo. Então,devagar,com incrementos, eu acrescentava pedacinhos aqui e ali -- para efeito dramático, entende?
Isso parecia razoável...no início. Até onde eu podia perceber, qualquer experiência VERDADEIRA -- por mais chocante, assustadora, engraçada ou humilhante que fosse -- sempre se perdia no relato. Todos os grandes autores reclamam da falta de adequação da linguagem como meio de relatar uma experiência. Minha solução para esse enigma foi simplesmente tornar os instantes ousados ainda mais radicais, a dor dez vezes mais intensa, a farsa um tantinho mais ridícula.No que me dizia respeito, eu estava simplesmente recriando a EXPERIÊNCIA que vivera em benefício do meu ouvinte. Se os fatos precisavam ser, bem , ligeiramente reajustados, então que assim fosse. Tudo era relativo, afinal.
E eu não fazia só reinventar os acontecimentos. De vez em quando, talvez mais do que de vez em quando, eu tinha tendência a reinventar também a mim mesmo, sabe, em termos do papel que eu poderia representar. Talvez devesse simplesmente confessar: eu tinha um complexo de herói.
Sei que isso soa estúpido, mas eu adorava a idéia de ser um cara legal, alguém que salvava o dia, alguém que era – e não existe jeito melhor de dizer isso – diferente. Não sei por quê. Acho que me sentia apenas... psicologicamente forçado a ser.
O psicanalista de Morag, com quem ela me subornou para eu me consultar nas semanas seguintes à morte de papai, disse-me que eu sofria de baixa auto-estima. Ele disse que era comum para pessoas que se valorizavam pouco ter fantasias, fingir que poderiam ser algo mais do que realmente eram. Pude ver algo de verdade no que ele disse – afinal, era verdade que eu não tinha uma opinião muito boa sobre meu eu da vida real.
Mas acho que o problema era anterior à minha formação psicológica. Acho que era genético, algo que herdei do meu pai. A verdade era que papai e eu éramos muito parecidos sob vários aspectos. Ele queria viver para sempre porque queria que sua vida significasse alguma coisa. Considerava-se diferente,especial. Eu também me considerava assim. Eu não queria viver para sempre ( mesmo que isso se tornasse possível um dia ), mas certamente pensava que minha vida poderia significar mais do que significava, que ela poderia vir a ser algo espetacular.
O fato de durante a vida toda eu só ter tirado notas médias, ter sido mediano (medíocre, na verdade) em esportes, ter sido querido medianamente, ter tido um sucesso mediano com as mulheres – o fato de ser mediano em praticamente qualquer coisa em que me envolvesse não abalava essa convicção dentro de mim. Se isso tinha algum efeito, era apenas torná-la pior.
Eu literalmente me via como o herói de um daqueles filmes frustrantes onde só ele conhece a Verdade e ninguém mais acredita nele. Ainda assim, era apenas uma questão de tempo. Assim como para o herói do filme, o meu dia chegaria. Eu seria vingado. Em breve, todo mundo iria perceber o quanto eu realmente era especial.
Nesse meio-tempo, é claro, isso queria dizer que eu passava boa parte da minha vida me decepcionando.
E isso talvez seja parte do motivo que me fez continuar a criar esse universo paralelo, essa terra de fantasia, esse outro lugar, onde tudo que acontecia era superemocionante e impressionante e trágico e cômico e veloz e fantástico e onde, obviamente, eu era a personagem principal. O único que dava sentido àquele universo, o único que mantinha a ordem, o único que combatia o mal e que reparava os erros -- em outras palavras, o herói. "


Will Rhode- Bestseller

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